Acho que ainda está em exibição em Portugal, o último filme e belíssimo filme de Mike Leigh, Mr Turner, filme esse que já abordei aqui num post anterior. Realço mais uma vez aqui neste post que Mr Turner está muito bem realizado e a escolha dos actores e principalmente do actor principal foi muito bem feita, no sentido em que Timothy Spall, destituído de qualquer charme, beleza, simpatia e empatia consegue dar vida a um William Turner que tinha tanto de genial como de anti social, roçando mesmo a bestialidade. Saímos do cinema amando ou ainda amando mais a sua obra e algo surpreendidos com o modus vivendi da pessoa que a realizou no sentido que o que ali vemos é um ser que pouco apelava à simpatia de quem com ele convivia sendo que o mesmo pouco fazia para que isso viesse a acontecer.
O Terraço de Mortlake |
De facto e pelo que me foi dado a ler, em termos pessoais Joseph Mallord William Turner (1775-1851) , mais conhecido por William Turner, pouco procurou ao longo da sua vida dar-se bem com quem quer que fosse, tendo como único foco de interesse a sua obra e o amor incondicional que nutria pelo pai e que tão bem foi retratado no filme do M. Leigh.
Era um homem arrogante e se virmos bem, talvez essa arrogância mascarava o facto de não ver ser devidamente reconhecido o seu génio artístico, visto que o mesmo sempre almejou ser um grande pintor devidamente reconhecido pelos seus pares . Resta a consolação de não o ter sido em vida, mas tê-lo sido em morto, pois não só foi o percursor de estilos vindouros como legou -nos uma obra ímpar.
Na sua vida pessoal e afectiva, Turner manteve-se sempre um cockney impenitente, nada escrupuloso consigo e para com os outros (vide a relação escabrosa que o mesmo mantinha com a sua governanta pelo qual não nutria qualquer afecto...muito pelo contrário!) não era nada dado a grandes limpezas, não procurava falar correctamente, resmungava constantemente, era solitário e mantinha o seu foco de atenção virado para as suas telas, a sua mistura incrível de cores, as suas paisagens terrestres e marítimas, as viagens constantes para fora e pelo interior da Grã-Bretanha e o seu aguçado sentido estético. No fim da vida casa-se com uma antiga senhoria e nesse casamento vemos o vislumbre de algum amor de Turner pela sua esposa.
Em termos artísticos se havia entre os seus pares e não só quem lhe reconhecesse a genialidade não era menos certo que uma certa elite não perdia ocasião de o rebaixar quanto mais não fosse pela incompreensão demonstrada pelas suas telas e a sua paleta cromática e até pelo seu próprio feitio difícil.
W.Turner-Auto Retrato |
Quase sempre associamos Turner às cores, e que cores! Se no principio os seus quadros tomavam uma tonalidade soturna predominando as cores escuras, lentamente Turner vai fazendo uma viragem e talvez fruto a sua convivência com aguarelistas, começa a dar liberdade às tonalidades das suas pinturas a óleo e o que vemos a uma dada altura, são tonalidades novas e sem precedentes. É então que começam a aparecer paisagens marítimas e não só de tirar o fólego e onde a mistura de cores, a perspectiva e o traço irão lançar este pintor para o panteão dos artistas imemoriais e fazer do mesmo o precursor dos impressionistas, algo que vamos dando conta ao longo do filme e que M.Leigh tão bem soube explorar.
A obra de William Turner que aqui aparece, denominada de Terraço de Mortlake, é tão simples e tão belas que chega a impressionar. O que vemos é uma tarde de verão em Inglaterra e onde o rio Tamisa vai correndo tranquilamente. Vemos barcos de recreio que se destacam por detrás das árvores altas magnificamente executadas na sua simplicidade. As sombras destas projetam-se na faixa de relva e vemos que algumas pessoas que passeiam observam o cão que salta para o parapeito do muro que bordeja esta agradável alameda. Aqui nada está a acontecer de importante mas no entanto o nosso primeiro olhar vai para a figura pintada em tons negros do cão que se destaca como elemento principal a par das altas árvores. É uma cena calma e ao mesmo tempo vibrante como tudo o que Turner fez. Aqui e como sempre é a luz que se destaca como foco principal do artista em causa e o mais incrível que tudo serve de pretexto para dar grande suavidade a luz do sol. A luz agita-se no ar, ela vai branquear os montes que vemos ao longe, vai tornar as árvores translúcidas, projecta um padrão de sombras em diagonal na relva baça tornando toda a cena algo de fascinante. A perspectiva em fundo parece não ter fim e está singela e magnificamente executada.
Estamos assim perante uma das grandes obras de um grande pintor, um homem que legou à humanidade algumas das mais incríveis telas que o olhar do homem pode ver e apreciar.
A seu tempo irei abordar as telas marítimas deste génio chamado William Turner.
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