sábado, setembro 13, 2014

Frida Kahlo-Uma Vida de Sofrimento

 "Lembro-me que tinha sete anos quando se deu a "Decena Trágica.Testemunhei com os meus próprios olhos a batalha dos camponeses de Zapata contra os Carrancistas".
Foi com estas palavras que Frida Kahlo (1907/1954), ao escrever no seu diário nos princípios de 1940, descreveu as suas recordações da Decena Trágica, "os dez dias trágicos" de Fevereiro de 1913.
De facto, a sua identificação com a Revolução Mexicana (1910/1920) foi tão forte que ela sempre disse ter nascido em 1910. Seguindo-se à era colonial e aos trinta anos de ditadura do general Porfírio Díaz, a revolução procurou implantar mudanças fundamentais na estrutura social do país.
Frida Kahlo decidira aparentemente que ela e o novo México tinham nascido ao mesmo tempo. Na verdade, Frida era três anos mais velha, até porque Magdalena Carmen Frieda Kahlo Calderón nasceu a 6 de Julho de 1907 em Coyocán, mais tarde um subúrbio da Cidade do México, terceira das quatro filhas de Matilde e Guilerme Kahlo.
Numa conversa com a crítica de arte Raquel Tibol, a artista descreve pormenores da sua infância."A minha mãe não me podia dar de mamar porque a minha irmã Cristina tinha nascido apenas onze meses depois de mim. Fui amamentada por uma ama, cujos seios eram lavados imediatamente antes de eu mamar. Num dos meus quadros apareço, com cara de mulher adulta e corpo de criança, nos braços da minha ama, com leite a escorrer dos seios dela como se fossem do céu." A obra em questão é A Minha Ama e Eu", de 1937.Por outro lado descreve o pai como sendo cordial e carinhoso, "A minha infância foi maravilhosa", escreveu ela no seu diário, "porque apesar do meu pai ser um homem doente (sofria de tonturas frequentes), foi para mim um grande exemplo de ternura, de trabalho (como fotógrafo e também como pintor) e, acima de tudo, de compreensão de todos os meus problemas."
Também se recorda, quando teve poliomielite aos seis anos, o modo especial como o pai tomou conta dela durante os nove meses de convalescência. A sua perna direita ficou muito magra e o pé esquerdo atrofiado. Apesar do pai se certificar de que ela fazia regularmente exercícios de fisioterapia para fortalecer os músculos debilitados, a perna e o pé ficaram deformados para sempre. Esse foi um sofrimento que, enquanto adolescente, ela procurou esconder dentro das calças e, mais tarde, debaixo de compridas saias mexicanas, que acabaram por lhe definir para sempre uma extremamente imagem original e ao mesmo tempo algo trágica.
Tendo-lhe sido na infância posta a alcunha de "Frida da perna de pau",  algo que a magoava profundamente, ela veio  contudo mais tarde a ser o centro das atenções com as suas vestes exóticas que usou até morrer. Acompanhou várias vezes o pai, um entusiasta artista amador, nos seus passeios, como pintor, pelas zonas campestres locais. Ele ensinou-a também a usar máquina fotográfica e a revelar, retocar e colorir fotografias-experiências que vieram todas elas a ser muito úteis para a sua pintura.
No dia 17 de Setembro de 1952, ao voltar da escola para casa, Frida Kahlo e o namorado apanharam um autocarro para Coyoacán.Poudo depois deu-se um terrível acidente: o autocarro chocou com um eléctrico e várias pessoas sofreram morte imediata.Frida também ficou muito ferida, o que levou os médicos a duvidarem da sua sobrevivência.
Um ano depois, num pequeno esboço a lápis, a que ela vai intitular de "Acidente", regista o trágico acontecimento que viria a modificar-lhe a vida de maneira decisiva.Devido ao acidente ficou de cama durante três meses.
Passou um mês no hospital.Depois de inicialmente parecer ter recuperado por completo, começou a sentir dores na coluna e no pé direito. Também se sentia sempre cansada. Aproximadamente um ano depois, deu de novo entrada no hospital. A coluna não fora radiografada na altura do acidente, e só então se descobriu que tinha várias vertebras deslocadas. Durante o nove meses seguintes teve de usar uma série de coletes de gesso, que depois vieram a ser pintados por ela. Nas inúmeras cartas que escreveu a Alexandro Gómez Arias desabafou tudo o que sentiu durante este período em que esteve completamente privada de liberdade de movimentos corporais e em que por vezes tinha de ficar imóvel na cama. Foi nesses meses que começou a pintar, como um modo de evitar o aborrecimento e a dor. "Eu senti que tinha energia suficiente para fazer outras coisas sem ser estudar para vir a ser médica"."Comecei a pintar sem dar muita importância a essa actividade", disse ela mais tarde ao crítico de arte Antonio Rodríguez. "O meu pai, teve durante muitos anos, uma caixa de tinas de óleo e pincéis dentro de uma jarra antiga e uma paleta a um canto do seu estúdio fotográfico. Ele gostava de pintar e de desenhar paisagens de Coyoacán junto ao rio e por vezes copiava cromolitografias.Desde pequenita, eu não tirava os olhos daquela caixa de tintas. Não sabia explicar porquê! Como ia ficar presa a uma cama durante tanto tempo aproveitei a oportunidade para pedir a caixa ao meu pai. Como um miúdo pequeno a quem tiram o brinquedo para dar ao irmão doente, ele emprestou-ma. A minha mãe pediu a um carpinteiro que me fizesse um cavalete de pintor, se é que isso se podia chamar ao material especial que se conseguiu montar na minha cama, pois eu não me podia sentar por causa do colete de gesso. E assim comecei o meu primeiro quadro: o retrato de um amigo".Também se colocou um dossel com um espelho que cobria toda a parte de baixo da cama de modo que Frida se pudesse ver e ser o seu próprio modelo. Num dos seus quadros Kahlo retrata-se, precisamente deitada nesta cama de dossel, em que o seu esqueleto paira sobre ela, num prenúncio do infortúnio que se tornaria a sua vida.
Assim começaram os auto retratos (que pintava quase que obsessivamente) e que vieram a dominar a obra de Frida Kahlo, permitindo-nos ver todas as etapas do desenvolvimento desta grande artista mexicana.
"Eu pinto-me porque estou muitas vezes sózinha e porque sou o tema que conheço melhor".
O pequeno filme que realizei procura mostrar alguns dos auto retratos desta pintora excepcional, que nos deixou inúmeras obras e que procurava neles reflectir o momento pelo qual passava e que embora fossem bastante "fortes", não eram surrealistas: "Pensaram que eu era surrealista, mas nunca fui. Nunca pintei sonhos, só pintei minha própria realidade". Frida contraiu uma pneumonia e morreu em 1954 de embolia pulmonar, mas no seu diário a última frase causa dúvidas: "Espero alegremente a saída - e espero nunca mais voltar - Frida".
Talvez Frida não suportasse mais, tanta dor física e tanto sofrimento emocional.

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